CARNAVAL DOS ANOS 40
Carnaval. Carnaval português. O das cegadas, dos trapalhões mascarados que enfarinhavam quem por perto se chegasse, dos entronchados que, brincando, pregavam partidas aos mais desprevenidos. Carnaval das fitinhas, dos papelinhos às cores, das caraças de cartão feitas à mão, das salas de baile enfeitadas.
De sábado gordo a quarta-feira de cinzas era o pandemónio. Deitar os entrudos, na segunda-feira gorda, constituía o quadro mais hilariante da aldeia: Ti António Francisco recolhia, durante todo o ano, os lapsos dos conterrâneos de quem se sabia uma atitude anedótica, uma farsa involuntária. Naquela noite percorria as ruas da Louriceira levando consigo meia população, arrastada pela graça natural desta figura popular.
"Estás a pé ou a cavalo?" gritava ti António Francisco ao primeiro visado da noite, através do seu altifalante (um funil de largas dimensões) "Vem à porta ou à janela para ouvires uma gaitada.Berra a música rapaziada! " E as tampas das panelas, os latões e os penicos, qual orquestra bem afinada, chamavam o farsante para a frente da multidão afim de ser julgado e poder desculpar-se. "Com que então, levantaste-te, ainda de noite, para ordenhares a cabra e, só depois de muito espremeres, sem resultado, é que deste conta de que não era a cabra, era o bode!... Tens direito a uma gaitada! Berra a música, rapaziada!"
E, assim, de casa em casa, de gargalhada em gargalhada, se esgotava a noite de segunda-feira de Carnaval.
É certo que o riso não matava a fome! Mas matava as tristezas.
José Saramago in Nossa Terra Nossa Gente
Notável este artigo, o qual retrata as tradições e os costumes das gentes populares das aldeias deste país! Outras épocas... outras culturas!...
ResponderEliminarObrigado, mas poderia não utilizar o anonimato uma vez que se trata de um elogio...
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